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Revista IBDFAM: especialista investiga o novo perfil da curatela
O artigo “O novo perfil da curatela e a atuação do Ministério Público na era da tecnologia e da resolutividade”, do professor e promotor de Justiça Fernando Gaburri, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, é um dos destaques da 61ª edição da Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. A publicação é exclusiva para assinantes.
O objetivo do texto, segundo o autor, é oferecer elementos para que os operadores do Direito compreendam as alterações trazidas pela Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD e pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – LBI, e apliquem adequadamente os institutos jurídicos ali tratados.
“Há algum tempo venho estudando sobre a capacidade jurídica da pessoa com deficiência à luz dos princípios da autonomia, independência e igualdade, previstos na CDPD, e sobre a curatela e a tomada de decisão apoiada a partir das alterações trazidas pela LBI”, explica Fernando Gaburri.
De acordo com o professor, a LBI trouxe significativas e profundas alterações no sistema de capacidade, vigente desde o Código Civil de 1916 e mantido com algumas alterações no Código Civil de 2002, e nos limites da curatela (antes tratada como interdição). Também trouxe o instituto da Tomada de Decisão Apoiada, como forma de dar cumprimento ao artigo 12 da CDPD.
No entendimento do especialista, “os institutos não vêm sendo adequadamente aplicados pelos operadores do Direito. “Muitas vezes, insistem em ignorar as inovações legislativas, aplicando-os como se a redação original do CC ainda estivesse vigente.”
A partir da LBI, destaca Fernando Gaburri, o critério de aferição da capacidade jurídica deixa de considerar a gradação de discernimento e passa a trabalhar com a possibilidade de expressão da vontade. Há também a substituição de “capacidade civil” por “capacidade jurídica ou legal”.
“A LBI expressamente declara, em seu artigo 1º, que o seu fundamento principal é a CDPD (de status constitucional), o que leva, a partir de sua vigência, à análise dos institutos infraconstitucionais nela tratados a partir do referencial dos direitos humanos”, comenta.
Gaburri complementa: “A curatela provisória vem sendo concedida liminarmente com base em argumentos que serviriam para fundamentar qualquer decisão, lastreada exclusivamente em laudo médico que se presta a relacionar a deficiência e a incapacidade como se ambas sempre estivessem em uma inexorável relação de causa e efeito, do tipo: se é pessoa com deficiência, logo é incapaz”.
“Além de inverter o ônus do tempo do processo em desfavor do curatelando, a tutela provisória, via de regra, é concedida liminarmente juntamente com o despacho inicial, na maior amplitude objetiva possível para, desde já, limitar a prática de absolutamente todos os atos negociais e patrimoniais. Daí em diante, garantias processuais, como a oitiva pessoal do curatelando e a manifestação de equipe interdisciplinar, são flexibilizadas, havendo a indicação de um curador especial, cujo parecer, vazio de conteúdo fático e jurídico, é quase sempre no sentido de que o julgamento atenda ao melhor interesse da pessoa com deficiência, assim levando a uma sentença que nada mais faz do que confirmar a tutela liminar e logo transitará em julgado devido à não interposição de recursos, ainda quando cabíveis”, pontua.
Autonomia e independência
Para Fernando Gaburri, a concretização da autonomia, independência e igualdade da pessoa com deficiência – princípios expressos na CDPD – refletem diretamente no exercício de direitos existenciais e patrimoniais. “Considerando a presunção de capacidade da pessoa com deficiência (LBI, art. 6º), ficam-lhe assegurados o exercício pessoal – sem a intervenção de terceira pessoa – de direitos existenciais ligados ao Direito das Famílias, como constituir família, exercer direitos sexuais e reprodutivos, ter filhos, conservar a fertilidade, adotar e ser adotada etc.”
“Em relação aos instrumentos de apoio, a LBI deu franca preferência para a Tomada de Decisão Apoiada – TDA, que preserva a autonomia e a independência da pessoa com deficiência, ao facultar-lhe solicitar o apoio de pelo menos duas pessoas idôneas, com as quais guarde vínculo de confiança, para atuarem como coadjuvantes na tomada de decisões referentes à vida civil, oferecendo-lhe os elementos e informações de que necessita”, observa.
A LBI, acrescenta Gaburri, torna a curatela medida extraordinária (medida substitutiva de vontade que só deve ser adotada na insuficiência das medidas de apoio baseadas na autonomia da pessoa), proporcional (restringindo sensivelmente o seu alcance aos atos de natureza patrimonial e negocial) e que deve perdurar o menor tempo possível.
O professor reforça que a curatela vem sendo aplicada em sentido protecionista, “como se fosse a regra, como se não existisse TDA, como se decretá-la fosse sempre o melhor para a pessoa com deficiência, como pré-requisito para a concessão de benefícios previdenciários (como auxílio doença e aposentadoria por invalidez) e assistencial (para pleitear ou sacar os valores do Benefício de Prestação Continuada – BPC)”.
“A preservação da capacidade jurídica da pessoa com deficiência para a prática de atos negociais reflete respectivamente no Direito das Famílias e das Sucessões, no tocante à escolha do regime de bens e à elaboração de testamento e codicilo, atos personalíssimos pelos quais poderá declarar a sua última vontade, direcionando os seus bens (dentro dos limites legais) a quem melhor lhe aprouver”, comenta.
Gaburri lembra da última audiência pública promovida pela Comissão de Reforma e Revisão do Código Civil, em dezembro de 2023 em Salvador/BA. “Tive a oportunidade de defender a ampliação da capacidade testamentária ativa da pessoa com deficiência (não se confunde com capacidade civil ou jurídica), sugerindo a ampliação da possibilidade de escolha das formas testamentárias ordinárias pela pessoa com deficiência visual e auditiva, bem como a utilização de tecnologia assistiva de escolha da pessoa com qualquer deficiência, para manifestar sua última vontade com segurança jurídica, se assim entender necessária.”
A íntegra deste e outros artigos exclusivos está disponível na 61ª edição da Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões exclusivamente para assinantes. Garanta o seu exemplar por meio do site ou pelo telefone (31) 3324-9280.
Por Débora Anunciação
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